domingo, 9 de maio de 2010

Cultura


A palavra cultura provém do latim medieval significando cultivo da terra. Do verbo latino original colo que é igual a cultivar, que juntando a cultum, forma a palavra cultura, que, volto a dizer, no início era relativo ao cultivo da terra.

Sua transformação começa a partir da sabedoria acumulada no trato do ambiente natural, e a experiência secular de pastores e agricultores acabaram conferindo ao termo cultura o sentido de conhecimento intelectual, aplicado à ação transformadora do mundo. Por outro lado, podemos dizer que é a convicção do saber acumulado pela existência do trabalho que produz uma libertação de condicionamento.

Antropologicamente sabemos que a cultura é o conjunto de experiências humanas adquiridas pelo contato social e acumuladas pelos povos através do tempo.

Conceitos

Italo Calvino diz: “quem somos nós? Quem é cada um de nós senão uma combinatória de experiências, de informações, de leituras e imaginações? Cada vida é uma enciclopédia, uma biblioteca, um inventário de objetos, uma amostragem de estilos, onde tudo pode ser continuamente remexido e reordenado de todas as maneiras”.

Analisando o que disse Calvino, refletimos que na realidade brasileira atual podemos sim ser uma biblioteca, mas uma biblioteca de livros editados e, na melhor das hipóteses, editados por um único canal de televisão, ou por algumas vozes poderosas de um mesmo rádio, situado num sistema de comunicação a serviço de uma elite dominante.

Um outro conceito nos diz que a cultura é uma expressão simbólica das linguagens, da imensa diversidade que caracteriza o processo e os modos como os povos definem as suas identidades. Num contexto como o nosso, complexo, contraditório, difícil, rico, espelhado pela riqueza do saber popular, afirmamos então que a cultura é um elemento fundamental de resgate dos valores sem os quais a experiência humana torna-se uma experiência empobrecida e amarga. Por isso essa cultura deve ser solidária, fraterna, igualitária, liberta, justa e que se contraponha à avalanche imposta pelo projeto neoliberal, que, como diz Patrus Ananias, “reduz o sonho humano a uma conta bancária, uma casinha de praia”.

A cultura vista desta forma, solidaria, fraterna, liberta e justa, é um instrumento de luta permanente da memória contra o esquecimento, é abrangente, criadora e mantenedora de valores, significados, símbolos, normas, mitos, imagens, etc... presentes nas práticas cotidianas, nas instituições, movimentos, pensamentos, na arte. É uma cultura que penetra nos coletivos humanos e nos indivíduos, dos conceitos de trabalho às emoções. Com esse sentido ela é o modo de viver, ser, fazer, pensar, sentir, simbolizar e imaginar das sociedades humanas.

Constatamos, porém, que com essa diversidade ela é plural e com isso traz diferenças nos significados culturais, mas também cria certas condições que levam uma sociedade inteira a participar dessa mesma criação coletiva, quer seja através da cultura popular, da erudita, da cultura de massa ou da cultura revolucionária para a libertação, expressa através dos ritos religiosos (grandes procissões), espetáculos artísticos, movimentação política ou outros.

Porém, cultura não significa tão somente esses momentos ou somente o espetáculo. Como diz Marilena Chauí, “cultura não é simplesmente a arte ou o evento”, não é área ou departamento, não é definida pela economia de mercado, é na verdade e sobretudo “criação individual e coletiva das obras de arte, do pensamento, dos valores, dos comportamentos e do imaginário".

Expresso isso, não podemos nos limitar a pensar a cultura apenas como manifestação cultural, temos que a pensar como parte da trajetória da raça humana, como a marca deixada pelo homem e pela mulher na história do mundo, pois o ato que gera a cultura é a criação, a invenção, a transformação, e trabalhar com a cultura é trabalhar com a revolução do próprio corpo, pensamento, no tempo e no espaço, a todo instante, trabalhando o momento de critica e de construção, de continuidade e percepção, porque a cultura faz com que você se olhe no espelho e se reconheça como o próximo, como o outro, como o diferente, como o igual, como o negro e o branco, trabalhando nas múltiplas possibilidades.

(Júnio Santos)

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