terça-feira, 18 de setembro de 2012

Um presente para Marta


Marta Suplicy assumiu o posto de Ministra da Cultura com um presente nas mãos. Um dia antes de sua posse, o Senado aprovou, em ato claro de apoio ao governo, a PEC - proposta de emenda constitucional - que estabelece a criação do Sistema Nacional de Cultura. Não é pouca coisa.

O Sistema pode ser a alavanca que a pasta precisava para conseguir mais recursos e sair da posição de insignificância a que costuma ser relegada. "É essencial para o fortalecimento institucional da Cultura, para inseri-la no cenário dos ministérios", opina Sérgio Mamberti, secretário de políticas culturais.

A inspiração para o projeto veio do Sistema Único de Saúde (SUS). Sua função é estabelecer vínculos entre a esfera municipal, os governos de Estados e municípios para a condução de uma política comum. Também define um conjunto de metas a serem alcançadas, cria uma rede de indicadores culturais, além de traçar estratégias e prazos. "É como o saneamento básico. Algo que ninguém vê, não traz visibilidade, mas funciona como base, como alicerce", compara José Roberto Peixe, secretário de Articulação Institucional do Minc.

Uma das principais vantagens da nova lei é garantir certa estabilidade à cultura, resguardando-a da inconstância das mudanças de governo. "Os políticos terão que se balizar pelas metas estabelecidas. E isso deve minimizar a descontinuidade. É claro que cada novo governante tem as suas diretrizes, mas existem objetivos comuns que devem prosseguir independentemente da mudança de governo", opina Mamberti.

Para Alfredo Manevy, que foi secretário executivo do Minc durante a gestão Juca Ferreira, o sistema amplia "as condições de que as políticas culturais ganhem mais perenidade e mais alcance." Ele, porém, ressalva que "nenhuma política está imune a retrocesso. Mais que um sistema, é preciso de um consenso político nacional".

Marta entrou no ministério sinalizando seu desejo por um orçamento maior. Como o sistema pode ajudar na briga? O peso institucional que o SNC dá não só ao Ministério, mas ao setor cultural, deve contar pontos. Para fazer parte do sistema, cada Estado e cada município precisarão ter uma área governamental voltada à cultura. Parece trivial. Mas ainda é imensa a quantidade de lugares em que o setor não possui a devida representação.

Outra exigência do Sistema: cidades e estados não irão apenas aderir a um plano pactuado nacionalmente. Ficam obrigados a definir suas próprias estratégias. Em suma, a ter uma política específica para a área. "A cultura ainda é vista, em grande parte do País, como uma atividade esporádica, relacionada, por exemplo, a realização de eventos", observa Peixe.

Boas intenções nem sempre são suficientes para fazer uma lei sair do papel. Neste caso, porém, o secretário de Articulação Institucional do Minc acredita que o SNC tenha chances consideráveis de decolar.

No momento em que aderirem ao sistema, Estados e municípios não ganham apenas deveres. Também terão garantidos repasses de verbas do Fundo Nacional de Cultura. A aposta é que a existência de dinheiro disponível atraia o interesse dos governantes para a área. Outro sinal de que o Sistema tem boas possibilidades de funcionar: ele já caminhava, em boa medida, antes da aprovação da lei.

Até agora, cerca de 75% dos Estados e 22% dos municípios já aderiram de maneira voluntária ao sistema. No ano passado, a ex-ministra Ana de Hollanda também já havia conseguido aprovar o Plano Nacional de Cultura. O documento, compêndio de 53 metas para o setor a serem alcançadas até 2020, entrou em vigor de forma independente. Mas é, na verdade, um dos braços do Sistema Nacional de Cultura. "O Plano define as grandes metas e o sistema oferece alguns meios de implementação, como conselhos e fundos. O sistema não é fim, é meio. Mas pode ser um meio poderoso, se houver cooperação entre município, estados e governo federal", acredita Alfredo Manevy.

Corre, por fora, a votação de uma outra medida que poderia favorecer grandemente o novo sistema: a PEC 150, lei que estabelece piso mínimo de 2% do orçamento federal, 1,5% do estadual e 1% do municipal.

Neste campo, porém, a conquista não deve vir de presente: ainda é preciso dobrar a resistência do Planejamento, que não é propriamente um entusiasta da medida.

MARIA EUGÊNIA DE MENEZES
AGÊNCIA ESTADO 

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