domingo, 21 de outubro de 2012

Os romancistas atuais


Trecho do ensaio "O romance do Nordeste", de Graciliano Ramos:

Os romancistas atuais compreenderam que para a execução de obra razoável não bastam retalhos de coisas velhas e novas importadas da França, da Inglaterra e da Rússia. (...) Hoje desapareceram os processos de pura composição literária. Em todos os livros do Nordeste, nota-se que os autores tiveram o cuidado de tornar a narrativa não absolutamente verdadeira, mas verossímil. Ninguém se afasta do ambiente, ninguém confia demasiado na imaginação. (...) Esses escritores são políticos, são revolucionários, mas não deram a ideias nomes de pessoas: os seus personagens mexem-se, pensam como nós, sentem como nós, matam gente e vão para a cadeia, passam fome nos quartos sujos duma hospedaria. Os romancistas não saíram de casa à procura de reformas sociais: a revolução chegou a eles e encontrou-os atentos, observando uma sociedade que se decompõe. (...) Nessa produção excessiva há falhas, topadas, marcas de trabalho feito à pressa. Naturalmente porque estamos a correr sem nos termos acostumado a andar. O que é certo é que o romance do Nordeste existe e vai para diante.

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"Deve-se escrever da mesma maneira como as lavadeiras lá de Alagoas fazem seu ofício. Elas começam com uma primeira lavada, molham a roupa suja na beira da lagoa ou do riacho, torcem o pano, molham-no novamente, voltam a torcer. Colocam o anil, ensaboam e torcem uma, duas vezes. Depois enxáguam, dão mais uma molhada, agora jogando a água com a mão. Batem o pano na laje ou na pedra limpa, e dão mais uma torcida e mais outra, torcem até não pingar do pano uma só gota. Somente depois de feito tudo isso é que elas dependuram a roupa lavada na corda ou no varal, para secar.

Pois quem se mete a escrever devia fazer a mesma coisa. A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso; a palavra foi feita para dizer."

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Graciliano Ramos de Oliveira (Quebrangulo, 27 de outubro de 1892 " Rio de Janeiro, 20 de março de 1953) foi um romancista, cronista, contista, jornalista, político e memorialista brasileiro do século XX, mais conhecido por seu livro Vidas Secas (1938).

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