segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Crateús terá 1° assentamento negro do Ceará


A Fazenda Novilho, há 22km de Crateús, será a nova terra desta etnia composta por dez famílias


Crateús. Existem vários tipos de assentamentos rurais no Brasil. No Ceará, já são mais de 300, apenas com o selo do Programa Nacional de Crédito Fundiário (PNCF), que funciona como política complementar à reforma agrária, uma vez que permite a incorporação de áreas que não podem ser desapropriadas. Para incentivar à inclusão e equidade de grupos específicos, o Programa prevê ainda selos com adicionais em recurso, os selos Terra Negra Brasil, Mulheres Trabalhadoras e Juventude. Em Crateús, cinco estão sendo encaminhados por meio dessa modalidade. Entre estes, uma novidade: um deles contemplará famílias negras. Será o primeiro assentamento de famílias negras do Estado do Ceará.

A avaliação dos resultados dos projetos de assentamento rural no Brasil não tem sido consensual. Posicionamentos diversos têm sido constituídos nos meios políticos e acadêmicos. Uns afirmam a inviabilidade da reforma agrária, atacando a ação dos movimentos sociais ou discutindo os procedimentos políticos administrativos nos assentamentos. Outros defendem a viabilidade dos projetos como necessários para a configuração de um novo espaço agrário brasileiro. Controvérsias à parte, muitos projetos de assentamento vão acontecendo no País.

Sobre os três selos o supervisor do Programa do Ceará, Cléber Gomes Bonfim, destaca que "assim, o Governo possibilita a esses três importantes e grandes públicos a compra da terra, como forma de resgate cultural e de novas formas de trabalho e produção na zona rural".

Entre eles está o selo o Terra Negra Brasil, que prevê condições especiais para acesso ao PNCF com recursos complementares na implementação de produtos comunitários e/ou coletivos para grupos de negros e negras não quilombolas. Foi neste primeiro selo que as famílias negras de Crateús foram encaixadas. "O percentual de negros no Nordeste é grande, daí a destinação deste selo pelo Programa", conta ele.

Nova terra

A Fazenda Novilho, há 22km da cidade, será a nova terra desta etnia composta por dez famílias. São cerca de 190 hectares de terra, com açude, cacimbões, caixa d´água, seis casas, eletrificação, poço, entre outras benfeitorias, em localização privilegiada, próxima aos municípios de Crateús, Tamboril e Nova Russas. Muitas destas benfeitorias estão desativadas, como é o caso do poço. Outras funcionando, mas necessitando de reformas, como o curral para animais. Também inexistem cercas. Os novos proprietários, que atualmente enfrentam também a carência de água terão muito trabalho pela frente para tornar a propriedade produtiva.

Compra da propriedade

O presidente da Associação da Unidade Produtiva da Fazenda Novilho, Manoel Rosa, foi quem despertou há um tempo atrás o sonho de comprar a propriedade dos demais moradores, que fazem parte das dez famílias negras e residiam há muitos na localidade. "Doía ver a propriedade disposta à venda há uns três anos, então de repente, veio em mim a ideia".

Procurou o supervisor Cléber, natural do Município, para obter informações sobre a concretização do sonho. E encontrou por parte do supervisor abertura para iniciarem com os trâmites legais acerca da compra da propriedade. "Daí em diante foi sonhar e trabalhar muito", diz Manoel referindo-se ao caminho longo que percorreu neste ano tratando sobre reunião com os moradores, a negociação da terra com os proprietários, projeto, documentação da Associação e entendimentos para o financiamento.

Há um mês para realizar o sonho, já que o projeto encontra-se na fase final, o agricultor de 61 anos têm agora outros sonhos. "Já fico imaginando esta terra com muitos plantios, o açude cheio, o verde como sendo a maior paisagem, a cerca feita, as cisternas, a criação de animais, tudo sendo cuidado por nós". Ele afirma não temer os desafios de recuperação e de investimento que terá nos próximos meses, junto com as demais famílias, que são na realidade parentes. "Trabalharemos com muito gosto, pois será para nós, era um sonho antigo possuir terra própria", conta lembrando as inúmeras vezes que já se destacou para o sul do País em busca de oportunidades de trabalho e voltou para a sua terra natal, logo que o inverno chegava. "Meu lugar é aqui", acrescenta. A data para fechamento legal do negócio está marcada para o dia 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, que será um marco na vida das famílias.

Disposição

Os outros futuros assentados, assim como Manoel, afirmam ter disposição para enfrentar o trabalho na nova propriedade. Nazaré de Sousa, prima de Manoel e considerada por todos como a matriarca do grupo, se diz animada com a nova fase da sua vida e da família. "A nossa família é acostumada com trabalho, fomos criados na luta e na terra, aqui é o nosso lugar". Ela vive na Fazenda há 23 anos e diz que o primeiro investimento que imagina fazer é solucionar a falta de água. "Buscaremos construir cisternas de placas e outras coisas para termos água em épocas como essa, entre outras melhorias, pois agora será nossa". Antônia de Maria, com a filha e a neta, que moram na Fazenda há 15 anos, dizem que não veem a hora do dia chegar. "Lutaremos para fazer tudo crescer e desenvolver", diz ela, cuja casa está prevista ser renovada no projeto, pois ainda é de taipa.

A autonomia e a descentralização são princípios fundamentais do Programa. Os agricultores escolhem e negociam o valor da terra, encaminham a proposta de financiamento, definem o projeto produtivo e a assistência técnica. O financiamento tem o valor máximo de R$ 40 mil por beneficiário ou beneficiária, englobando a compra da terra, assistência técnica e implementação de infraestrutura produtiva. Os juros variam entre 3% a 5% ao ano com prazo de até 17 anos para quitar o financiamento, incluindo a carência de dois anos, com condições especiais para pagamentos feitos no dia do vencimento.

No caso da Fazenda Novilho, a Associação receberá em torno de R$ 250 mil, afora o crédito adicional de R$ 1 mil por família e após a implantação terão acesso ao Pronaf, entre outros projetos. O Governo do Estado, por meio da Unidade Técnica do Estado (UTE) acompanhará o processo, com respeito a assistência técnica e implementação da estrutura produtiva, juntamente com a Ematerce e a ONG Flor do Pequi. "Eles irão construir o caminho deles, por meio do esforço e da boa aplicação dos recursos, pois a oportunidade é única", diz o supervisor.

Possibilidades

"Nós lutaremos para fazer tudo crescer e desenvolver, aqui, nesse lugar"

Antônia de Maria
Assentada

"Já imagino esta terra com plantios, o açude cheio, o verde como paisagem"

Manoel Rosa
Presidente da Associação da Unidade Produtiva da Fazenda Novilho

"O governo possibilita a compra da terra, como forma de resgate cultural"

Cleber Gomes Bonfim
Supervisor do Programa no Ceará

MAIS INFORMAÇÕES

Associação da Unidade Produtiva da Fazenda Novilho
(88) 8839.1828/ 9215.1378
http://www.mda.gov.br/

CRÉDITO

Nova vida para o trabalhador rural

Crateús. O Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), por meio da Secretaria de Reordenamento Agrário, desenvolve o Programa Nacional de Crédito Fundiário (PNCF) que oferece condições para que os trabalhadores rurais sem terra ou com pouca terra possam comprar um imóvel rural por meio de um financiamento.

O recurso ainda é usado na estruturação da infraestrutura necessária para a produção e assistência técnica e extensão rural. Além da terra, o agricultor pode construir sua casa, preparar o solo, comprar implementos, ter acompanhamento técnico e o que mais for necessário para se desenvolver de forma independente e autônoma. O financiamento pode tanto ser individual quanto coletivo.

Aquisição

Para adquirir uma propriedade pelo Programa Nacional de Crédito Fundiário primeiramente deve-se atentar para pequenas áreas, não passíveis de desapropriação, cujos donos tenham interesse em vendê-las. A documentação do proprietário e da terra devem estar em dia, de forma a permitir a sua transferência legal.

Público

O público do Programa é composto por agricultores e agricultoras rurais sem terra, na condição de diarista ou assalariado; arrendatários, parceiros, meeiros, agregados, posseiros e proprietários de terra cuja dimensão é inferior ao módulo rural. O potencial beneficiário deve ter, no mínimo, cinco anos de experiência rural nos últimos 15 anos.

O Programa prevê, ainda, ações de incentivo às mulheres, jovens e negros rurais contemplando também projetos especiais para o convívio com o semiárido e o meio-ambiente. "O Programa Nacional de Crédito Fundiário foi criado para diminuir a pobreza no campo e melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores rurais, trazendo a oportunidade a estes trabalhadores de recomeçarem uma nova vida, baseada no trabalho e produção", afirma o supervisor do Programa no Estado do Ceará, Cléber Gomes.

SILVANIA CLAUDINO
REPÓRTER

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